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Artigos: Social Bond – Contratos de Impactos Sociais

7 de junho de 2023

Working Paper produzido pelo Dr. Marcel Marques, no âmbito da disciplina Direito das Sociedades em Especial do Mestrado em Ciências Forenses pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologia de Lisboa, em maio de 2022. Caso queira o paper na íntegra não hesite em pedir ao Autor.

Em caso de citação, lembre-se de fazer referência ao produtor deste conteúdo, sob pena de plágio ou violação dos direitos autorais. Tenha uma ótima leitura.

Abreviaturas

  • ASG – Ambiental, Social e Governação;
  • ESG – (Environmental) Ambiental, Social e Governação;
  • GB – Green Bond;
  • MSCI – Morgan Stanley Capital International;
  • OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico;
  • OECE – Organização Europeia de Cooperação Econômica;
  • ONU – Organização das Nações Unidas;
  • SBP – Social Bond Principles;
  • SIBS – Social Impact Bond;
  • SURE – Temporary Support to mitigate Unemployment Risks in an Emergency;
  • (Apoio Temporário para Mitigar os Riscos de Desemprego em Casos de Emergência);
  • UE – União Europeia.

Índice

  1. Introdução;
  2. O que são as Social Bonds;
  3. Como funcionam as SIBS;
  4. Os atores envolvidos nos contratos das obrigações sociais;
  5. Esg e as Áreas de Impacto Social;
  6. As Social Bonds são públicas/Estatais ou Privadas?;
  7. Os Anti-ESG;
  8. Aspectos Legais das Social Bonds;
  9. O SURE – Temporary Support to mitigate Unemployment Risks in an Emergency 15;
  10. Considerações Finais;
  11. Referências Bibliográficas.

Introdução

O presente paper visa oferecer uma descrição breve sobre uma modalidade de contratos de obrigações sociais, denominados Social Bond, como uma alternativa de investimentos dedicada a projetos sociais que dão retorno aos investidores no caso de os resultados esperados serem atingidos dentro de um determinado prazo estipulado.

Tenciona apresentar a origem e os aspectos legais inerentes ao tipo de investimento, explicar seu funcionamento, dizer quem são os atores envolvidos nessa transação e quais são os requisitos que permitem que pessoas singulares ou coletivas possam ser habilitadas a investir em projetos com matrizes ESG, ou seja, em projetos sociais dedicados ao meio ambiente, questões sociais e governação das empresas, no contexto das Social Bonds.

As informações foram extraídas de diversos relatórios e de outros papers, além de órgãos estatais e organismos internacionais como a ONU, OCDE, OECE e a UE, uma vez que ainda não há muita produção científica sobre essa temática que possui uma grande relevância do ponto de vista econômico, financeiro e social, especialmente no âmbito da União Europeia.

Tais obrigações sociais tiveram um papel importante em relação as consequências que abalaram o mundo em razão do surgimento da COVID-19, o que será exemplificado ao longo do texto.

Em conclusão faremos uma reflexão sobre a diferença da Green Bond e da Social Bond, uma abordagem sobre o risco de investimento dessa última e a possibilidade de aplicação prática da instrumentalização desse contrato de impacto social no âmbito das freguesias portuguesas.

1 – O que são as Social Bond

Dentre as várias definições sobre o significado das Social Bonds, referimo-nos àquela descrita no Handbook Financial Instruments for Social Impact[1], qual seja: Trata-se de um Título de Impacto Social (SIB), que é um tipo de contrato de pagamento por resultado envolvendo 3 (três) partes: uma Organização do Setor Público (o «Comissário»); uma Organização Social (a «Entidade Implementadora» ou «Prestadora de Serviços»); e um Investidor Social.

Referem-se a projetos ligados à infraestrutura de serviços básicos, habitação acessível, segurança alimentar, bem como àqueles dedicados ao combate dos impactos causados pela covid-19 (SURE), dentre as inúmeras possibilidades, às quais algumas delas serão oportunamente exploradas nesse paper.

Tais títulos, ou melhor «contratos» baseados em resultados firmados entre os investidores e o emitente que se compromete com determinados impactos, promete retorno ou reembolso condicionado ao cumprimento desses objetivos.

Para entrarem nessa categoria, esses ativos tem de cumprir os Social Bond Principles (SBP), relativos à transparência, divulgação e reporte. Esses princípios pretendem ajudar os emitentes a desenhar as emissões da dívida de forma a maximizar os fundos alocados a projetos sociais.

1.1 – Como funcionam as Sibs

O primeiro título de impacto social foi criado em 2010, no Reuno Unido[2] e levantou cinco milhões de libras de vários fundos e outras fundações, cerca de seis milhões e setecentos mil dólares. Essa SIBS redurizam o nível de reincidencia de presos a curto prazo na prisão de Peterborough, cujas taxas de delinquência eram muito altas naquele sítio, em que cerca de 60% dessa população cometia novos crimes no primeiro ano após sair da prisão.

No presente caso, identificou-se que não haviam serviços de suporte para essa população egressa do sistema carcerário, que saíam sem dinheiro, emprego ou lugar para viver.

Esse contrato de impacto social durou por cinco anos, beneficiou cerca de dois mil ex-presidiários e atingiu os resultados desejados com a redução da reincidência em 9%, resultando em rendimento aos investidores de 3% (três por cento) ao ano[3].

As Social Bond passaram a se destacar mais na União Europeia após a primeira emissão dentro dessa comunidade dos Estados Membros, quando foram colocados dezessete milhões de euros para financiar o programa europeu de auxílio ao emprego, no âmbito do SURE, sigla de Temporary Support to mitigate Unemployment Risks in an Emergency (Apoio Temporário para Mitigar os Riscos de Desemprego em Casos de Emergência), revelendo-se como uma operação histórica, com um juro negativo e uma procura recorde, que certamente refletiu nos custos dos empréstimos aos países membros da União Europeia[4].

Portugal, por exemplo, é um dos países que se beneficia com a emissão dessas obrigações sociais, que pretendem melhores condições do que se o país recorresse diretamente financiamentos junto a investidores internacionais, isso representou para Portugal uma economia de 4,5 (quatro milhões e quinhentos mil euros) por ano, face ao que teria que pagar se fosse aos mercados internacionais.

A estimativa que se cumpriu até o final de 2021, era de que a instituição europeia emitiria 100.000.000 (cem milhões de euros) em Social Bond para financiar o «sure», tornando-se o maior emitente deste tipo de títulos.

O quadro a seguir, que tomamos emprestado da (socialfinance.org)[5] acompanhado de explicação adiante, demonstra como o Social Bond funciona:

O governo, ou qualquer outra organização legalmente constituída identifica a questão social e o objetivo.

Para atingir o objetivo, eles fazem parceria com um intermediário, como o Social Finance, e prestadores de serviços de alto desempenho – organizações com histórico de sucesso e evidências de que seus programas funcionam.

A Social Finance trabalha com o governo/empresa e o provedor para conduzir a concepção, negociação e estrutura financeira do projeto.

Em seguida, levanta-se o capital de investidores de impacto para fornecer financiamento inicial e flexível.

O provedor oferece serviços para a população-alvo, com suporte contínuo da Social Finance, incluindo supervisão de governança, gestão de desempenho, correções de rumo e gestão financeira e relações com investidores.

Com o apoio de serviços de alta qualidade, as pessoas necessitadas alcançam melhorias de vida – tendo partos saudáveis, criando filhos prontos para o jardim de infância, ficando fora da prisão e encontrando e mantendo bons empregos.

Um avaliador independente mede o impacto do projeto de acordo com métricas de resultados predeterminadas. Se o projeto for bem-sucedido, o governo ou o “comissário” – conforme for este autor – reembolsa os investidores do projeto. No entanto, os pagamentos são feitos aos investidores apenas no nível dos resultados alcançados[6].

1.2 – Os atores envolvidos nos contratos das obrigações sociais

Geralmente é de um determinado governo, mas como já dissemos, pode ser de outro tipo de instituição, organização e iniciativa privada que se extrai ou de onde se emana as informações ou demandas relativas a uma questão social emergente, na qual ainda se estabelecem metas específicas para resolvê-las.

Outro ator envolvido é a figura do prestador social, geralmente uma organização social sem fins lucrativos que executa projetos em nome do estado, ou conforme o caso de entidade, ou de uma empresa para promover o alcance social desejado às pessoas ou determinada comunidade necessitada de avanços sociais, nos moldes definidos nas áreas (Environmental) Ambiental, Social e Governação – ESG.

Finalmente, outro «player» de grande relevância, sem o qual o sistema também não teria a engrenagem necessária está na atuação dos investidores, estes que financiam uma causa específica por meio de um título ou contrato de impacto social, como já dissemos ser algo possível por meio do desempenho alcançado pelo alcance obtido na vida da sociedade.

Assume-se que os investidores obtenham ou não retorno do seu investimento, na medida em que tais objetivos sejam ou não alcançados, podendo esse tipo de investimento ser considerado de maior risco em relação aos investimentos tradicionais, caso não se conheça o potencial ou a credibilidade dos executores dos projetos objetos dos contratos de impactos sociais.

Outras figuras que podem existir no universo das obrigações de impactos sociais são outros intermediários ou avaliadores independentes que podem ajudar a projetar ou supervisionar projetos de vínculos de impacto. À título exemplificativo há diversas empresas especializadas nesse seguimento voltado a pesquisa de investimentos que oferecem informações sobre investimentos tradicionais e de ESG, como a  Morgan Stanley Capital International (MSCI), que está há mais de 50 anos no mercado[7].

1.3 – ESG e as Áreas de Impacto Social

Já foi possível perceber que a temática das Social Bonds envolvem novas e inúmeras siglas, as quais desejamos criar afinidade para o desenvolvimento e aprofundamento dessas ideias e da execução dessa realidade na prática, eis que o termo ESG ou «ASG» são frequentemente utilizados e significam (Environmental) Ambiental, Social e Governação como áreas abrangidas pelos impactos sociais, cuja classificação se destina a medir o desempenho de uma empresa com esses padrões “ambientais, sociais e de governança”.

Dentro de cada área (ESG) existem inúmeras possibilidades de contribuições sociais, tomemos alguns exemplos setores, como: educação em saúde, emprego social, bem-estar, meio ambiente e agricultura, populações de pessoas sem teto, desenvolvimento da primeira infância, água potável, cuidado com idosos, adoções, violência de gênero, entre outras, todas com projeto específico e foco em obter resultados específicos, que já foram implementados em mais de 37 países de vários continentes[8].

A identificação dessas oportunidades de investimentos estão muitas vezes expressos em fundos privados, cuja denominação inclui as expressões ESG, SIBS, diferenciando-se daqueles que não negociados como os demais fundos tradicionais.

Revela-se, entretanto, que há fundos que embora promovam investimentos que em sua gênese possuam matrizes que resultam impactos em investimentos que privilegiam habitação e saúde a preços acessíveis, desenvolvimento econômico e a transição para um futuro de baixa emissão de carbono, ou seja, atigem positivamente as áreas ESG, mas não são originalmente SIBS, como podemos mencionar o Domini Impact Bond Found (DSBFX) que em sua essência são, mas não utilizam os SIBS[9].

O principal diferencial das Social Impact Bonds é a de “permitir inovações em programas sociais que ficariam muito complexos se tentadas diretamente pelos Governos locais”[10].

1.4 – As Social Bonds são Públicas/Estatais ou Privadas?

Uma questão relevante é saber como é possível investir em fundos que promovam tais impactos sociais, entretanto, como dissemos essas obrigações são de natureza privada decorrentes de projetos por prestadores de serviços que são remuneradas pelos governos ou por outras iniciativas se atingirem os resultados esperados, cujos títulos emitidos possuem objetivos sociais ao abrigo das premissas já mencionadas, permitindo que investidores obtenham seus lucros caso as organizações especializadas na execução dos serviços de matrizes sociais atinjam os resultados desejados na promoção de impactos sociais nas áreas ESG.

Esses títulos estão disponíveis somente para investidores institucionais ou credenciados[11], que somente são credenciados se comprovarem patrimônio líquido pessoal acima de 1 milhão de dólares, ou demonstrarem possuir renda anual de mais de 200 mil dólares em cada um dos últimos 2 anos.

Embora muitos contratos sejam firmados com governos, a origem dos investimentos são privados, ou garantidos por bancos, ou pelo próprio emissor do título.

1.5 – Os anti “ESG”

 Os investimentos de impacto social acolhem ações voltadas ao meio ambiente, à questões sociais e/ou de governança, e como retromencionamos são investimentos realizados em âmbito privado e sem a intervenção estatal.

Assim, e apenas para mencionar en passant a existência de um contraponto às Social Bond, é que há quem leve a temática desse tipo de investimento para a esfera das correntes polítcas e lhe faça oposição.

Tais antagonismos foram evidenciados conforme declaração de um empreendedor norte americano que criou um fundo de investimento que podemos dizer “anti-esg”, privilegiando sempre investimentos que desconsidera o enfoque dado pelas áreas sociais dedicadas ao meio ambiente, questões sociais ou setores de governança.

Na opinião do empresário de Ohio, Vivek Ramaswamy[12] “A maioria dos norte-americanos quer que as empresas fiquem fora da política”. “Eles querem ter um espaço onde fazem compras, onde trabalham e onde investem, à parte dos lugares onde votam ou se envolvem em debates políticos.” (SIC)

Embora não seja objetivo desse paper adentrar nesse mérito, entendemos relevante mencionar a existência de antagonismos para promover a reflexão sobre os caminhos que melhor possam ser adotados na relação investimentos, governabilidade e questões sociais.

Crê-se que formas diferentes de enxergar o mundo, sua discussão e reflexão são sempre saudáveis e bem vindas, não havendo necessidade de uma forma se impor agressivamente sobre a outra, mas de coexistirem no mercado, e, conforme a preferência dos investidores –  que possuem suas próprias convicções – perceberão pelas próprias leis do mercado e da concorrência as mais bem sucedidas ou não.

2 – Aspectos Legais das Social Bonds

É de se considerar que a iniciativa das Social Bonds decorre da evolução e da concentração legislativa mundial em termos de proteção e sustentabilidade do planeta em todas as suas esferas, e o direito naturalmente delas faz parte para que as coisas aconteçam nos termos da lei, com a mínima organização, direcionamento e finalidades pretendidas.

Tais esforços mundiais visam a proteção do meio ambiente, relativamente aos recursos naturais essenciais para a subsistência da vida em sociedade – que sempre apresentaram desafios na qualidade que se estima de que todos os cidadãos merecem ter/ser – e ainda, em como as empresas, instituições – sejam públicas ou privadas – administram suas atividades em observância aos diversos setores que englobam o (Environmental) Ambiental, Social e Governação – ESG, critério que estimula e identifica as áreas que essas organizações precisam atingir no mundo como o resultado de suas atividades.

Nesse sentido, a Organização das Nações Unidas – ONU e demais organismos internacionais, bem como a União Europeia aprovaram diversas Diretivas e Regulamentos que deram origem às iniciativas ESG, como o Acordo de Paris, que visa, dentre outros objetivos atingir a neutralidade das emissões de dióxido de carbono até 2050, bem como a Agenda 2030.

Impõe-se o reconhecimento, de que, geralmente carreados pelas iniciativas das Nações Unidas, especialmente àquelas oriundas dos compromissos mundiais firmados, designadamente com a criação do United Nations Environment Programme – Finance Initiative[13] (UNEP-FI), criada a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento – Eco-92 ou Rio92 no Brasil, os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio – ODM (2000-2015)[14], cujo interregno também foi criada em 2006 pela UNEP-FI, os Principles for Responsible Investment[15] (PRI), e da Agenda 2030 – esta que deu abertura a um novo ciclo de 15 anos – cuja unânimidade dos Estados-Membros se comprometeram com os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), divididos em 169 metas a serem cumpridas até 2030.

A Agenda 2030, também pode se basear em cinco dimensões conhecidas como as 5P[16]: Pessoas, Planeta, Prosperidade, Paz e Parcerias, e no cotejo com os objetivos e metas propostos reconhecemos o nexo causal que as Green Bond, Sustainability Bonds, Sustainability-linked Bonds, e as Social Bonds[17] possuem nesse contexto.

Antes de explorar os aspectos legais que amparam os contratos de impacto social, fazemos um aparte para demonstrar que o advento da Social Bond abre campo para iniciativas criativas de múltiplas matizes que podem ser adaptadas ou incorporadas em vários seguimentos, inclusive da administração pública, como por exemplo vem sendo realizado pela União Europeia.

Trata-se da incorporação desse espírito do cumprimento da Agenda 2030, também promovido pela UE entre as entidades públicas de seus estados membros por meio de orientações atualizadas e sensibilização para promover as aquisições socialmente responsáveis, denominadas «Compra Social», nas quais os governos dão preferência para aquisição de bens de organizações da economia social para os Contratos Públicos Socialmente Responsáveis (CPSR)[18], ou seja, «aquisições de impacto social».

Após fazer tais considerações, adentramo-nos um tanto mais quanto aos aspectos de pontos de vistas legais. O Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)[19] uniformiza os critérios que os Estados Membros e as sociedades comerciais precisam adotar no âmbito da UE, e a Diretiva (UE) 2017/1132 do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de junho de 2017, trata desses aspectos do funcionamento das sociedades de responsabilidade limitada, incluindo-se as sociedades de investimento.

A forma como os contratos das Social Bond são firmados atendem a diversas regras – restringimo-nos aqui ao mercado europeu – nomeadamente aos regulamentos de financiamentos sustentáveis como os Regulamento (UE) 2019/2088, relativo a necessidade de divulgação de informações relacionadas com a sustentabilidade, e o Regulamento 2020/852, relativo aos critérios de classificação de atividades ambientalmente sustentáveis, também conhecidos por taxonomia, transpostas, mesmo que parcialmente para o ordenamento jurídico português, e também expressas na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.

Abrimos um parêntese para mencionar que uma vez Membro da União Europeia, Portugal, assim como os demais aderentes devem aplicar de forma imediata os regulamentos aprovados pela Comunidade, e transpor as diretivas da UE[20] para o seu próprio ordenamento jurídico. No caso das diretivas, a não transposição pode ser caracterizada como uma infração que pode resultar em reclamação ou recurso perante o Tribunal de Justiça da União Europeia, o que de certa forma torna obrigatória a adesão do país a esses princípios.

Verifica-se que o Governo Português criou programas de financiamento por meio da Resolução do Conselho de Ministros nº 73-A/2014[21], publicada em Diário da República a 16 de dezembro de 2014, conhecida por iniciativa Portugal Inovação Social.

Tratou-se da Portaria n.º 97-A/2015, de 30 de março, que, via Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, o Governo Português também desenvolveu o Regulamento Específico do domínio da Inclusão Social e Emprego, no qual dedicou na Secção IV, do Capítulo VIII, os «Títulos de Impacto Social», dispostos nos artigos 238º e 243º.

Naturalmente a CMVM[22] passou a se dedicar às políticas da Comissão Europeia, e desde 2018, apresentou uma estratégia para um sistema financeiro que apoie a agenda climática e de desenvolvimento sustentável da UE, com vistas a reorientar capital privado para financiar a transição verde, cuja agenda regulatória europeia definiu de forma assertiva, que:

“A inclusão de fatores de sustentabilidade resultou já em várias propostas legislativas, nomeadamente sobre a divulgação de informação não financeira, direitos dos acionistas e normas para gestores de ativos e investidores institucionais, índices de referência, divulgação de informações relacionadas com a sustentabilidade, taxonomia, consideração de fatores, riscos e preferências em matéria de sustentabilidade no contexto das Diretivas sobre mercados de instrumentos financeiros (DMIF II), gestores de fundos de investimento alternativos (AIFMD) e organismos de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM)  (Diretiva UCITS) e Obrigações Verdes.”

Na realidade, o que se vê é que na iniciativa europeia voltada para os investimentos sustentáveis, as regras aplicadas no âmbito dessa comunidade tem sido aplicadas aos diversos mercados e nações de outros continentes por serem consideradas mais amplas em sua taxonomia, bem como uma das mais avançadas, uma vez que o mercado vem sofrendo pressão para atender aos parâmetros ESG nos investimentos.

Já no âmbito do Decreto-Lei n.º 262/86, em sua versão mais atualizada do Código das Sociedades Comerciais Português, a previsão do direito das sociedades anônimas de  emitir créditos está disposto no artigo nº 348º e seguintes.

O Código das Sociedades Comerciais representa bem a regra da união europeia da taxonomia das obrigações ESG, e do próprio funcionamento da negociação de um contrato de impacto social (SIBS), conforme analisamos a alínea d) do artº. 348º, ao definir:

“For disponibilizada aos investidores informação financeira relativa ao emitente, reportada a data não superior a três meses relativamente à emissão, auditada por auditor independente registado na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, e elaborada de acordo com as normas contabilísticas aplicáveis”.

Em Portugal, a própria Caixa Geral de Depósitos[23] já disponibilizou produtos bancários «investimentos» que são denominados como TIS ou CIS (Títulos de Impacto Social ou Contratos de Impacto Social) oferecendo benefícios fiscais para as empresas que invistam nesses «TIS», que, em sede de IRC são reconhecidos como gastos, que, desde 2018 sofrem majoração de 130 por cento, promovendo economia em seus custos fiscais.

Entende-se do que acima foi exposto, que as sociedades comerciais participantes da relação contratual por meio de uma obrigação de impacto social podem ganhar ainda algo mais do que incentivos, como financiamento a juros baixos, mas podem ainda ganhar relevância, projeção social e porque não a promoção de sua marca, como aquela que se dedica e se importa com o mundo como um todo, resultando assim em benefícios diretos e indiretos.

3 – O SURE – Temporary Support to mitigate Unemployment Risks in an Emergency

Como já mencionado no introito, SURE é a sigla que traduzimos por (Apoio Temporário para Mitigar os Riscos de Desemprego em Casos de Emergência), que foi ampla e efetivamente utilizada para enfrentar as consequências da pandemia do COVID-19, na união europeia.

Aos Estados-Membros da União Europeia foi facultado solicitar empréstimos para servir como uma segunda linha de defesa para proteger o emprego, nomeadamente os trabalhadores por conta própria e por conta de outrem do risco de desemprego e de perda de rendimentos.

Referimo-nos a uma linha de crédito com condições mais favoráveis às existentes no mercado durante o período da pandemia, que funciona por meio da criação de fundos de obrigações sociais, semelhantes àquela aplicada às Social Bonds, uma vez que os investidores interessados terão a convicção de investirem em obrigações de investimentos sociais criados pela Comissão Europeia a prazo de 5, 10 e 15 anos.

Tais fundos angariados são transferidos para os Estados-Membros beneficiários sob a forma de empréstimos que também passaram a ser cotados na bolsa de valores do Luxemburgo e na bolsa de valores verdes luxemburguesa, a principal plataforma mundial consagrada exclusivamente a valores mobiliários sustentáveis[24].

4 – Considerações Finais

Os Contratos de Impactos Sociais são muito relevantes, pois a nosso ver todas as partes envolvidas no processo, desde investidores ou empresas que auferem lucros ou diminuem custos quando há o fiel cumprimento e execução do contrato firmado; entidades que executam projetos em prol da sociedade beneficiando pessoas, sítios ou organizações.

Demonstrou-se ainda relevantes benefícios para as sociedades comerciais bem como aos governos que muitas vezes não possuem braços e esforços suficientes para atender as necessidades que a todo tempo emergem e carecem de proteção social.

Outras considerações importantes que podem trazer reflexões relevantes é a possibilidade de respondermos as seguintes perguntas, como a diferença entre as Green Bond – GB e as Social Bond, que em poucas linhas podemos afirmar substancialmente que a primeira se dedica única e exclusivamente a impactos positivos relacionados ao meio ambiente do ponto de vista climático ou da preservação da natureza, e que a segunda o meio ambiente como um todo (natureza, pessoas ou sociedade e organizações em geral).

Uma segunda questão, ainda dentro dessa retórica é a compreensão de que os critérios ESG são abrangidos tanto pelas GB, quanto pelas SIBS, especialmente a área “ambiental” (Environmental), não se tratando aqui de duplicidade de esforços, pois os títulos em si mesmos possuem atipicidades.

Uma das diferenças substanciais é que, quando no incumprimento dos títulos das Green Bond há indenização como forma de responsabilização, enquanto nas Social Bond o investidor está diante de um investimento de risco alto, e caso o contrato não atinja seu resultado no prazo estipulado deixa de auferir Return Over Investment – ROI[25], ou recebe tão somente proporcionalmente ao realizado.

Relativamente aos riscos de investimentos nas SIBS verificamos uma proposta feita por especialistas, com a adoção de uma espécie de garantia denominada Covered Bonds[26].

Avançamos para o final ao trazermos à baila a percepção de que muitas empresas buscam executar determinadas ações que visam a estabelecer um viés de «responsabilidade social», envolvendo clientes, como no caso de uma rede de supermercados, por meio do «Programa Bairro Feliz»[27], na qual os clientes escolhiam apoiar uma determinada causa da comunidade local.

Pensamos que toda iniciativa de colaboração com o meio em que (con)vivemos deve ser considerada, mas talvez o desconhecimento ou a vontade política da “governança” das pessoas colectivas deixam de optar por caminhos mais ousados e com impactos mais amplos e relevantes, estes que podem ser alcançados pelo compromisso firmado mediante um contrato de impacto social, uma Social Bond.

Finalmente, ao observarmos a disposição do poder local nas cidades portuguesas, instituído pela Lei Fundamental[28], podemos concluir que as Autarquias Locais, uma vez que possuem órgãos representativos em cada freguesia, sendo a assembleia órgão deliberativo e a junta de freguesia como órgão executivo possuem plena liberdade de contratar SIBS.

Exemplificamos ao considerar que, desde uma instituição sem fins lucrativos que vive de doações obtidas porta a porta, bem como de um projeto que poderia ser dedicado aos Bombeiros Voluntários, a nosso ver, amoldam-se de uma forma que proporciona um encaixe (a depender da vontade do órgão deliberativo) ideal, onde se possa construir uma «plataforma de lançamento» de contratos de impacto sociais dedicados aos interesses exclusivos que vise a suprir as carências ou interesses em prol das comunidades de sua abrangência, incluindo-se aí empresários, cidadãos e instituições executoras dos projetos que vierem a ser firmados, oferecendo os resultados para cada parte envolvida, do investidor à comunidade.

Referências Bibliográficas

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Dr. Marcel Marques é advogado há 10 anos e atua nas principais áreas do Direito em Portugal e de forma digital/eletrônica no Brasil e com cooperação técnica do maiores advogados de Brasília/DF e diversos outros estados.
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